Oi, gente.
O trio de roteiristas/ilustradores Laudo Ferreira, Marcatti e Germana Viana começou a publicar, em 2020, a HQ “Ménage”, projeto para quem gosta de histórias em quadrinhos eróticas a partir de um tema em comum. A edição de estreia tinha histórias que envolviam armários, enquanto que a segunda edição teve o livro como tema. A terceira revista, que chegou às nossas mãos lá por novembro, aumentou o desafio: afinal, os artistas tinham que criar HQs que envolvessem saca-rolhas.
Revistinha lida, podemos afirmar que o trio passou com louvor na empreitada. E é interessante perceber como Germana, Laudo e Marcatti – além dos traços e estilos pessoais de cada um – conseguem criar tramas originais e usar o objeto de formas diferentes. No caso de Germana Viana, a artista segue contando a história dos casais que trocam de par na São Paulo do final da década de 1950 – Benedito com Ernesto e Marlene com Vera. Desta vez, porém, apenas os rapazes aparecem na HQ: à procura de um saca-rolha emprestado, eles terão que defender um adolescente vítima de ataques homofóbicos em pleno carnaval.
Marcatti desenvolveu duas histórias para a mais recente edição de “Ménage”. Na primeira, o dono de um boteco e seu último cliente da noite – ambos cheios dos preconceitos contra homossexuais – perdem a inibição quando abrem uma garrafa de vinho esquecida há décadas no estabelecimento. A segunda história é justamente sobre a origem da tal garrafa e por que o seu conteúdo tem um “sabor especial”.
Enquanto isso, Laudo Ferreira volta a tratar de religião na HQ. Em “Assim caminha a humanidade”, o quadrinista imagina um destino inusitado para um dos pregos utilizados na crucificação de Jesus Cristo, que vira objeto de cobiça, corrupção, traição e morte quando cai nas mãos dos membros de uma seita neopentecostal.
A campanha para a próxima “Ménage”, cujo tema será “piscina”, já está no Catarse, e é possível apoiar o projeto comprando o pacote com as quatro revistas ou apenas a edição avulsa, entre outras opções. Também é possível adquirir os primeiros números procurando pelo trio no Instagram (@laudoferreira, @marcatti_hq e @germana_fazgibi).
Além de “Ménage”, enfim tirei da minha pilha da vergonha (leitores de quadrinhos entenderão) as três primeiras edições de “Tianinha”, uma das mais conhecidas criações de Laudo Ferreira e que estavam na lista infinita de coisas para ler há mais ou menos dois anos.
Assim como no projeto em parceria com Germana Viana e Marcatti, “Tianinha” é para a turma que tem mais de 18 anos, pois o assunto da HQ é sexo (quase) sem limites. A história começa com a protagonista vivendo em um templo no Nepal, em busca de autoconhecimento e iluminação, até receber um “chamado” e perceber que havia chegado a hora de partir. Fora do templo, ela vai cruzar com divindades hindus e antigos amantes até ser convencida a participar de um espetáculo em um circo nada convencional, em que a próxima parada será a Índia.
Para quem curte quadrinhos adultos, “Tianinha” é uma excelente pedida, e a série já está na quinta edição. Para adquirir todos os números, é só procurar o artista e ver se as revistas ainda não esgotaram as tiragens.
Por fim, precisamos recomendar “Balões de pensamento – Textos para pensar quadrinhos” (Balão Editorial), do jornalista e tradutor e professor Érico Assis. A publicação, que concorreu ao HQMix 2021 na categoria Livro teórico, reúne alguns dos textos que Érico escreveu entre 2010 e 2013 para o Blog da Companhia, da editora Companhia das Letras, para o qual segue escrevendo até hoje.
Sabe esses livros que dão vontade de ouvir/assistir a 1.001 filmes ou discos antes de morrer? Pois “Balões de pensamento” provoca um senhor desejo de ler mais e melhores quadrinhos, pois não faltam indicações de ótimos artistas e HQs, muitos já publicados no Brasil. Eu mesmo coloquei algumas dessas revistas na minha lista de desejos daquele site que vende Kindle e Alexa.
Mas o livro de Érico Assis não se resume a recomendar bons quadrinhos. Os textos para o blog tratam de temas como os desafios da tradução, a incansável letreirista Lilian Matsunaga, cosplays, a interminável discussão “afinal, quadrinhos são literatura?”, artistas independentes e as infinitas pilhas de HQs que não param de crescer, mesmo quando nos acostumamos a ler as revistas em tablets.
Com pouco mais de 300 páginas, “Balões de pensamento” é o tipo de publicação que terminamos de ler num piscar de olhos, e que dá aquela vontade de sair conversando sobre quadrinhos com os amigos – mas, como o próprio Érico salienta no livro, “puxar o assunto ‘o que você achou do último Batman do Morrison?’ com um desconhecido ainda é risco de suicídio social”. E essa afirmação vale até os dias de hoje, mesmo com os filmes de super-heróis dominando Hollywood e qualquer “civil” (a turma que não veio dos quadrinhos) puxar assunto com a maior naturalidade do mundo sobre o último filme do Venom (DO VENOM, MINHA GENTE!!!).
Um dia, quem sabe, perderemos a timidez do nerd raiz.
Vida longa e próspera. E obrigado pelos peixes.