Nem sempre presto atenção no caminho que faço, embora sempre procure mudar um pouco o trajeto de um dia para o outro. Com um Centro que oferece a oportunidade de revezar ruas e galerias, não é tarefa tão complicada. Mas há bons anos circulando e conhecendo de cor e salteado esse espaço, é preciso andar com os olhos e ouvidos bem abertos para entender que ainda há muito a descobrir.
Distraído que sou, muitas vezes me peguei em meio a esbarrões e tropeções aqui e acolá. Meia dúzia de micos e uma vida inteira de bons achados. Um deles recentíssimo. Andava meio apressado, quando uma mulher e uma criança, carregando sacolas e uma mochila dessas com carrinho acoplado, me fizeram diminuir o passo, porque caminhavam na minha frente. Não tinha meio rápido de ultrapassá-las. Eu precisaria ter um pouco de paciência. Valeu a pena.
A criança puxou a mão da mulher. Elas pararam. A menina, que eu calculo não ter mais do que cinco, seis anos, disse: “Eu só queria dizer que eu te amo.” A mulher teve a atitude mais incrível que se pode ter, quando algo do tipo acontece: parou, deixou as sacolas no chão. Se colocou no mesmo nível da criança e a abraçou longamente, dizendo que também a amava.
Eu não sei que contextos estão envolvidos na breve cena que vi, mas me senti privilegiado. Alguns gestos gratuitos, despretensiosos e espontâneos mudam o rumo do dia da gente. Eu não pude acompanhar o desenrolar da situação, porque perderia o ônibus, mas o que vi foi o bastante para me sentir grato. Aquela mãe certamente deve estar morrendo de orgulho.
Banalizamos as palavras e engolimos o que temos vontade de falar. As pessoas que amamos precisam ser lembradas de que são amadas. Isso faz toda a diferença. Não tem uma data que seja mais apropriada, não tem local certo, não é preciso ser um marco. Não estou dizendo também que é preciso ser meloso o tempo todo. Mas aquela fala, aquele abraço, foram o suficiente para me lembrar que carinho também alimenta. Afeto é potência. Sensibilidade não é fraqueza, pelo contrário, é força que nos mantém despertos para ler o mundo de outras formas, é algo que deveria ser incentivado e não suprimido.
Imagino que, se as pessoas fossem incentivadas a lidar com seus pensamentos e sentimentos de forma mais saudável, e também a expressar o que sentem, as ruas e galerias da cidade estariam repletas desses pequenos (ou gigantes, dependendo do ponto de vista) gestos. Veríamos essas situações com mais frequência por aí. As relações poderiam ser mais leves e despreocupadas. Haveria uma abertura maior para que as pessoas se abram e falem sobre o que se passa com elas. Por enquanto, torço para que aquela pequena menina siga sensível e forte. Que cresça sendo incentivada a demonstrar o carinho que sente e que outras pessoas, assim como eu, possam ser inspiradas por ela.