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Contraste

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Foram muitos choques para uma mesma semana: o desprendimento da rocha em Capitólio, o efeito devastador do acumulado de chuvas por toda Minas Gerais, preocupação com pessoas queridas muito próximas que testaram positivo para Covid, um luto difícil de lidar no meio da história e outros muitos problemas que chegaram, inclusive, a afetar o sono de todos em casa.

Choveu por muitas horas, e a água começou a cobrir os passeios da rua. O córrego que passa no bairro transbordou, as ruas ficaram sujas e cheias de lama quando tudo passou. A coisa foi ficando intensa a ponto de só conseguirmos ver as nuvens nubladas. Elas encobriram o amarelo do Sol por tempo demais.

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Alguém chamou no portão e eu fui atender. Chovia fino àquela altura. Rapidamente me virei para subir as escadas de casa. As minhas dores e as dores das outras pessoas se somavam na minha cabeça.

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Foi quando uma borboleta dessas ordinárias, asas laranjadas e manchas pretas cortou meu torpor com seu voo leve. Ia e voltava das roseiras da vizinha, alheia a qualquer outra coisa que acontecesse no mundo. Alimentava-se do miolo das flores vistosas, que pareciam ter ganhado ainda mais cor após o banho de chuva. Ambos, inseto e flor, contrastavam com o meu humor, pesado, denso, taciturno. A leveza deles me deixou encabulado.

Eu não costumo identificar em mim o sentimento da inveja. O que é meu, é meu. O que é dos outros é dos outros. Mas naquele momento, me permiti sentir uma pontada de inveja daquela leveza. Mas logo percebi que havia um paralelo também. Se há vida, na flor, no inseto e em mim, há em nós a fragilidade diante da finitude. Água, doenças, poluição, desabamentos, tudo isso poderia acabar com qualquer um de nós em instantes.

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A diferença é que as rosas e a borboleta ignoravam qualquer dissabor, enquanto eu estava completamente imerso neles. Enquanto o voo dela em busca de alimento entre as pétalas na roseira continuava, eu tinha me distraído. Percebi uma brecha de sol por entre as nuvens carregadas. Esqueci, por alguns momentos, toda carga de preocupação que eu tinha levado comigo para fora. Cheguei a me sentir culpado por pensar em leveza no meio do caos. Mas depois, mentalmente, agradeci. A natureza continua eficiente em transmitir mensagens poderosas, e nós precisamos retomar a capacidade de lê-las urgentemente. Os pensamentos eram outros, completamente diferentes, quando alcancei o topo da escada.

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