Uma nova temporada de uma das minhas séries favoritas estreou e consegui contrariar meu costume de alongar a audiência e acabei maratonando seus longos episódios. Eu gosto da maneira como a obra tem a amizade como centralidade de toda a ação. Independente de qualquer crítica ou ponto que possa atrapalhar a experiência, há um carinho criado pelos personagens e pela forma como eles se relacionam que toma a atenção toda. São os conflitos e a cumplicidade entre esses amigos que fazem toda a história se tornar coesa e interessante.
O grupo de adolescentes, que até então vivia na cidade fictícia de Hawkins, se dividiu. Esse afastamento trouxe uma série de questões para os personagens, e isso movimentou a narrativa. Crescer e ao mesmo tempo lidar com as mudanças de interesses, de pontos de vista, de responsabilidades, entre outras, pode ser tão desafiador quanto enfrentar um monstro que se alimenta de medos, traumas e ansiedades.
Faz diferença perceber como o grupo, em situações adversas, ouve com atenção e sem julgamentos o que os outros têm a dizer, como cada ideia apresentada pode ser melhorada e encaminhar uma solução conforme eles se unem e se conectam. Como esse reconhecimento do que cada um tem como potência dentro daquele espaço faz com que eles se sintam seguros para compartilhar livremente suas sensações e intuições.
Até mesmo as características mais irritantes nesse contexto podem render saídas inteligentes, porque a confiança que eles encontram entre eles também desperta a coragem. Esse laço precisa ser cultivado.
Caro leitor, a partir deste ponto há um leve spoiler importante sobre a saga. Uma das passagens que alugou um espaço importante nos meus pensamentos, porém, foi um momento decisivo, em que os jovens precisavam rapidamente indicar a canção preferida de uma das integrantes do grupo, algo que poderia salvar a vida dela. Foi o momento em que peguei o controle e pausei o vídeo. Perguntei-me se saberia indicar as músicas favoritas das pessoas mais próximas do meu convívio. Falhei. Senti uma pontada de culpa, porque o primeiro pensamento que chega é o de que não estamos suficientemente presentes na vida das pessoas.
Eu me senti melhor logo na sequência, porque se alguém me perguntasse qual é a música que eu mais gosto, não saberia responder imediatamente. Tenho uma lista de 8 horas e 30 minutos com minhas músicas preferidas. Eu as descobri ao longo da vida. Algumas conheci há muitos anos, outras chegaram há pouco. Elas são especiais porque lembram vários momentos, me acompanharam no choro e no riso, nas celebrações e nos momentos de reflexão, compondo uma trilha sonora da vida. Não há como indicar uma só, mas na falta de uma preferida, podem usar qualquer uma dessas, caso eu esteja em perigo. Com sorte, vai funcionar.
Ao olhar para a minha rede, soube logo que eu erraria todas as músicas favoritas deles, mas eu não deixaria nunca de chutar alguma que me faça recordar aquela pessoa. Assim como nesse caso, especificamente, em que eles trabalharam com uma canção, poderia ser qualquer outra coisa: cores, comidas, filmes, lugares. Nossos gostos vão mudando, precisamos (re)conhecer as pessoas que amamos, (re)descobrindo o que as fazem felizes com o passar do tempo. O que também é capaz de ajudar a enriquecer nossas próprias listas de preferências e incrementar a bagagem que carregamos.
São essas as trocas que me interessam. É muito gostoso quando as amizades dividem conosco alguma indicação que as tenha tocado. Essa chancela é muito especial. Isso se torna assunto, algo a compartilhar, e gera novos pontos de vista. Sendo capaz, inclusive, de reorganizar as nossas preferências e, em alguns casos, sem exagero, de nos salvar.