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As flores no caminho

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Ter tempo cronometrado para tudo nos leva a esquecer de admirar as flores no caminho. A vida restrita às paisagens do bairro faz com que a gente perceba rapidamente qualquer alteração que se apresente no quadro emoldurado pela janela. Com olhar vago, entrei no carro do aplicativo que me levaria ao Centro. Poucas palavras trocadas com a motorista. O som do rádio e do trânsito ao redor preenchia o espaço.

Chegando à Rio Branco, um frondoso ipê rosa despedia-se de suas folhas, embora o número de cachos de flores ainda agarrados a seus galhos fosse considerável. Fiz um comentário breve com a condutora. Ela me disse que não tinha percebido como a árvore estava bonita, embora tivesse trafegado algumas vezes pela avenida naquele dia. “Nós nos esquecemos de ver as flores pelo caminho”, disse ela.

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Precisei ir ao bairro vizinho, resolvi aproveitar e fazer uma caminhada. No trajeto, encontrei um arbusto com flores com uma cor escura, que fica entre o roxo e o vinho, destacando-se lindamente do verde vivo de suas folhas. Na volta, perguntei ao responsável pelo jardim se ele não me deixaria recolher uma muda. Ele permitiu prontamente que eu retirasse um galho, com minhas próprias mãos.

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Tenho uma teoria de que o ato de pedir uma mudinha de planta para outra pessoa chega, mais cedo ou mais tarde, para todos nós. Independente de ser para satisfazer a própria curiosidade de plantar e ver se aquele organismo é capaz de vingar sob os nossos cuidados, ou para entregar uma forma vegetal de afeto para alguém que tenha mão boa para manejar aquela forma de vida.

Lembrei-me imediatamente do meu primo Matheus. Com seus olhos infantis curiosos, toca o mundo com sensibilidade, percebendo cada nuance que nossas retinas apressadas precisam ignorar. Ele é tão sagaz que já aprendeu que levar consigo alguma flor que encontra no caminho se tornou uma bonita forma de trazer alegria para a vida das pessoas. Tias, a mãe, a irmã, primas, professoras. Todo mundo que é importante na vida dele, e é sensível para reconhecer beleza nas flores, já ganhou um mimo florido do garoto. Quando pedi a muda ao cuidador do jardim, senti algo semelhante ao que vivia, quando colhia hibiscos no caminho do colégio para levar para as minhas professoras do pré-escolar. Algo que eu acredito ser próximo ao que Matheus experimenta quando colhe flores para presentear alguém: uma alegria genuinamente infantil de embelezar o mundo de outra pessoa. Andei boa parte do percurso satisfeito com o galho que cortei nas mãos. Entreguei ele à minha mãe, que manja muito mais do assunto do que eu, e estamos aguardando as raízes apontarem.

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Alegrou-me, por outro lado, passar em frente ao mesmo jardim dias depois e ver que uma outra pessoa estava pedindo galhos da mesma espécie ao cuidador. Quem sabe, aos poucos, consigamos tornar o olhar de todos mais sensível espalhando flores por todos os caminhos? Espero que tenhamos cada vez mais presente a alegria de poder falar que não só vimos e falamos das flores, como também que ajudamos elas a se proliferarem por aí.

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