Então, vejamos… Ricardo Oliveira, 27 anos, empresário de Goiânia, casado e pai de um menino de 1 ano e 9 meses. Alegando necessidade de se proteger – principalmente durante os depósitos bancários que fazia -, andava com uma arma a tiracolo, afinal, a criminalidade é uma ameaça crescente. Dia desses, no entanto, o homem de negócios chegou em casa e notou que a prima de sua esposa havia enviado para ela uma foto sua na balada. Ricardo não gostou. Obrigou a esposa e seu filho a seguirem com ele para o endereço da mulher com quem pretendia tirar satisfação. Chamou a jovem no portão, mostrou o celular para ela e atirou a queima-roupa. O noivo da vítima correu para ver o que estava ocorrendo e também foi morto a tiros por Ricardo que, para a polícia, alegou ter agido por “impulso”.
Já Jean Araújo Rufino de Chagas, 23 anos, foi morto por um agente penitenciário na Grande São Paulo que o confundiu com um “assaltante”. O rapaz acompanhava a esposa no hospital, quando decidiu verificar se o carro que ele havia comprado há apenas um mês ainda estava estacionado na rua. Ao chegar próximo ao local, ele se confundiu e tentou abrir o carro errado, cuja cor e modelo eram semelhantes ao seu. (Eu sempre tento abrir o carro errado!) Pensando tratar-se de um roubo, o agente Joaquim Fidelis Moreira Neto não teve dúvidas: atirou na cabeça de Jean, que morreu no local. Na delegacia, o agente foi ouvido e liberado, pois o delegado considerou que o autor do disparo agiu em “legítima defesa”, pois a vítima trajava vestimenta semelhante à usada em assaltos: um casaco de moletom. Hein?
Sobre esse episódio, o chargista da Tribuna, Mário Tarcitano, escreveu em sua conta no Facebook:
“Se não tivesse uma arma de fogo envolvida, o diálogo, provavelmente, seria este:
– Oww, tá maluco? Mexendo no carro dos outros…
– Ó.. desculpa, tava distraído… o meu é aquele ali igualzinho a este.
– Que susto! Achei que vc ia me assaltar….”
Estamos tão focados em nos proteger do outro, que ignoramos em nós comportamentos brutais e igualmente destruidores. Movidos pelo ódio e pela revanche, nós não percebemos no que estamos nos tornando. Se a ideia da construção de uma cultura de paz continuar a ser tratada como discurso dos fracos, continuaremos movidos pela insensatez que alimenta a lógica da violência.