Na semana em que todos os dias foram históricos – a começar pela cassação de Eduardo Cunha, as declarações do Ministério Público Federal sobre Lula que dividiram o Brasil e outras polêmicas questões políticas que envergonham o país -, fatos marginais do noticiário me chamaram tanta atenção quanto aqueles sob holofotes. A começar pela repercussão da coluna do jornalista da Tribuna Mauro Morais que, em seu espaço “Outras Ideias”, se propõe a dar voz a todas as gentes, até aquelas das quais não se gosta ou aceita.
Ao retratar o Carlinho do apito, personagem obscuro e polêmico de Juiz de Fora, em função do barulho que produz nas ruas da cidade, Mauro, o repórter, tornou-se alvo do ódio social destilado nas redes sociais. Ouviu xingamentos e até ameaças feitas pela farsa construída por essa tal “gente de bem”, indivíduos que levantam bandeiras sobre justiça social, sobre segurança e a falta dela, mas que agem com a mesma violência e injustiça que condenam. Mauro não se abateu e usou a rede social para, novamente, provocar:
“Há os que valem e os que não valem? A coluna “Outras ideias”, quando surgiu, não veio com o propósito de reverenciar personagens, mas de fazer um retrato de nossa cidade por meio de seus personagens. Não funciona como uma placa de mérito e honra, como faz a Câmara Municipal, mas como uma tentativa de valorização da narrativa coletiva. E, mais uma vez, cumpriu seu papel ao retratar uma cidade de ódio e perversidade. O apito incomoda, mas não fere. E, nesse sentido, vejo um apito como algo muito menos ofensivo do que a repercussão toda criada acerca de Carlinho. O mesmo desrespeito dele é o desrespeito da leitora que diz sobre a falta de sensibilidade, quando, na verdade, lê sem nenhuma compaixão. Tempos nos quais o outro é encarado como “problema”! (…) Ironicamente, ao sugerir essa entrevista, nosso desejo era justamente dizer do ódio. Dizemos, não é mesmo?!”, escreveu Mauro.
E por falar em ódio, o que dizer do linchamento a um travesti na Zona Oeste do Rio, covardemente espancado por homens que se sentem melhores do que aquele que não se reconhece em um corpo masculino? Após ser agredida verbalmente dentro do veículo, a vítima tomou a faca de um dos autores que foi ferido por ela. Acabou no chão, desacordada, enquanto três agressores chutavam sua cabeça como se o corpo caído ao solo fosse feito de qualquer coisa, menos de humanidade.
Em uma sociedade na qual bichos são, frequentemente, mais bem tratados do que gente, não é difícil entender porque a violência não toca ninguém quando o alvo é parte da escória. Para nos proteger da criminalidade, usamos grades e erguemos muros. Mas como nos defender do preconceito e da indiferença que nos ameaçam todos os dias?
Que Deus nos livre de nós mesmos.