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Nem que seja no futebol

julia coluna
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Eu me lembro da primeira – e acho que única – vez em que chorei por conta de futebol na minha vida. Brasil e Chile, oitavas de final, Copa de 2014, eu e algumas das minhas melhores amigas no Bar do Abud. Até para uma completa ignorante sobre as regras do esporte como eu, era nítido que o jogo estava amarrado, não ia pra frente, todo mundo com os olhos grudados na televisão, como se prendesse a respiração à espera do gol da salvação que tirasse a gente daquela angústia. Pior é que ele não veio, e quem salvou a carente pátria de chuteiras foi o goleiro Júlio César, para a comoção no botequim, na cidade, no país. Respiramos aliviadas, foi por pouco, abraçamos desconhecidos, AQUI É BRASIL etc. Chorei.

Ando vendo muitas manifestações de boicote à Copa, justificadas pelo momento sofrível do país, pela corrupção da CBF, pela lógica do “pão e circo”, pelo argumento clichê de “ópio das massas”, “vou torcer pra Argentina” (que fez um golaço aprovando a descriminalização do aborto na Câmara dos Deputados, diga-se de passagem), bla-bla-blá. Até entendo o senso de indignação, mas quando me lembro daquele 2014, em que aquele fim de jogo me lavou a alma, eu penso no quanto precisamos, sim, nos fartar de pão enquanto ainda podemos, e curtir o circo, ainda que pegando fogo.

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Quando o Brasil venceu o Chile nos pênaltis naquele ano, mal sabíamos que viria o 7×1 da Alemanha. Que a camisa da Seleção seria profanada por gente que bateu panela em prol de um golpe em uma mulher legitimamente eleita, e alguns até por intervenção militar. Que passaríamos meses perguntando, sem qualquer resposta, “Quem matou Marielle e Anderson?”. Que a Justiça nacional, ainda que historicamente sem credibilidade, cumprisse a máxima de piada pronta ao se pautar por convicções, em vez de provas. Que as seções de comentários de qualquer, qualquer endereço on-line, iriam se tornar o esgoto de ódio que vemos diariamente. Se a euforia no final da partida contra os chilenos quatro anos atrás levou esta atéia futebolística às lágrimas, eu acredito que, neste ano, expurgaremos, por uns poucos segundos, nossas mazelas, ainda que alienada e inocentemente. Que se dane. Nunca precisamos tanto de meter um golzinho. Nem que seja no futebol.

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