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Tião, o salvador da lavoura

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Adoro e odeio a expressão “Sebastianismo”. A simpatia é porque tenho certo fascínio por termos criados por trás de uma historicidade. Quando Dom Sebastião, rei de Portugal, desapareceu – na verdade, tinha era batido as botas em batalha – no norte da África, o trono lusitano ficou sem herdeiros diretos. Como sempre há um espertalhão, o Rei Filipe II da Espanha arrumou logo um jeito de abocanhar o reinado vizinho. Indignada com a dominação estrangeira, parte da portuguesada se recusou a acreditar que Tião havia morrido – e preferia crer que tinha só sumido, meio à Belchior-, e esperava a libertação dos espanhóis por uma volta redentora de seu monarca de direito. Deste sentimento, o anseio por um retorno salvador ilusório, surgiu a expressão: Sebastianismo.

Mas também detesto o termo, porque tende a nos levar ao conformismo, esperando por um Sebastião que magicamente nos resgate de tudo que nos fere a liberdade, a integridade e o futuro. Esquecemo-nos que não haverá regresso: o rei está morto. Ainda assim, mantemo-nos aguardando, quase sempre apáticos, por uma solução instantânea e que brote do absoluto nada, como erva daninha em jardim ou espinha em testa de adolescente. Enquanto isso, nossos direitos são arrancados, um a um, por alguém de fora que não deveria ter tomado o trono. Enganamo-nos, na certeza falaciosa de o monarca voltará. Não vai.

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Por outro lado, vez ou outra levantamo-nos do eterno chá de cadeira de Tião, e tentamos, nós mesmos, espantar o déspota que se apoderou do nosso trono, castrando ou planejando castrar o que nos deveria ser assegurado. É essa meninada ocupando as escolas e universidades. São as resistências trabalhistas. É quem toma bala de borracha na cara por segurar cartaz ou é preso pelo criminosíssimo porte de Pinho Sol. São também estes gringos que protestam contra a eleição de um bilionário xenófobo, machista, eugênico, racista, elitista e simplesmente risível para o cargo de presidente do país mais poderoso do mundo.

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Até porque eles sabem que aguardar a realeza não há de dar certo por lá. Rei por rei, apesar do que dizem as teorias da conspiração, Elvis esticou mesmo as canelas; e Michael Jackson não vai emergir da terra como no clipe de Thriller. Não tem Tião que salve a lavoura, então é melhor levantar os traseiros e lutar para que não se destrua as pontes (ainda raras) construídas entre as pessoas. Antes que levantem muros que as impeçam de ver umas às outras.

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