Na minha infância em Três Rios, não muito diferente de tantas – e deliciosas – infâncias de cidade pequena, lembro-me bem que, mal ia acabando agosto e já faziam a gente ensaiar o Hino da Independência. No colégio de freira onde estudei, como era de praxe na época – e ainda é em algumas instituições – meninas usavam saia de tergal azul-marinho plissada, e meninos, uma bermuda de brim da mesma cor, como mandam os estereótipos de gênero (mas isso é assunto para outro dia). No frio era mais democrático. Nós e eles usávamos uma horrorosa e justíssima calça de helanca azul-royal, com duas riscas brancas do lado. Eram os anos 1990.
Como toda criança que se prezava, a gente fazia piada e morria de rir dos versos da canção diferente do Hino Nacional que cantávamos toda sexta, sob olhos atentos (mas nem por isso onipresentes) dos inspetores de disciplina. Era nossa pequena e clichê transgressão: “Ja-ponêêês tem qua-tro fiiiiiiiiii-lhos”, entoávamos logo no começo da ode musical à Independência, seguido de versos pouco publicáveis que rimam com “garbo juvenil”. Mal sabíamos em qual Brasil nos tornaríamos adultos.
Por curiosidade e um raro momento de ócio, fui dar um Google na letra do Hino da Independência. E apesar de encontrar vários requintes finos de ironia pensando nos dias atuais, não consegui sequer esboçar um sorriso. “Já raiou a liberdade/No horizonte do Brasil”; “Houve mão mais poderosa /Zombou deles o Brasil”; e o maior deboche com a cara de todos os brasileiros: “Ou ficar a pátria livre/Ou morrer pelo Brasil”.
Hoje, zomba da nossa cara quem tem as malas, as cuecas e os fundilhos cheios de dinheiro, às custas de quem um dia acreditou em uma independência brasileira, que agora nem pra nome de avenida presta mais. Estão gargalhando bem nas nossas, fuças, tal qual eu fazia quando me apertava em ridículas calças de helanca.