Qualquer pessoa um pouquinho conectada já deve ter visto foto daquele amigo ou amiga habituée de academia, com a legenda “Vem, monstro!”, expressão que diz respeito ao desejo de “crescer”, isto é, ganhar massa muscular. Sempre acho um pouco de graça da referência.
Medrosa incurável que sou, penso na nossa concepção “clássica” de monstro: em geral uma criatura assustadora, o vilão das fábulas. Entidades que assombraram minha infância (e a sua, admita!), fadadas à maldade por má-índole ou por um grande trauma em algum momento da vida. Por esta lógica, “Vem, monstro!” , para mim, é sinal para correr por três dias e três noites sem olhar para trás.
Há também quem chame assassinos, estupradores, pedófilos, torturadores e outras estirpes de criminosos impiedosos de monstros. Spoiler: não são. Não porque sejam mais benevolentes que as criaturas pintadas como “o mal” nos contos infantis. Mas porque “monstrificá-los” dá a ideia de que são parte de um universo ficcional, em que a crueldade é inevitável ou justificável por um sofrimento pregresso.
O assassino de Campinas não é um monstro que “lutava pelo direito de ver o filho” e “se revoltou”. É um homem que matou 12 pessoas, das quais nove eram mulheres. É alguém que, na carta em que explicava o inexplicável, chamou a cada uma de nós de “vadia”, e ridicularizou a lei que nos defende contra violência, agressões de todo tipo e de feminicídio. De gente como ele, em suma.
Pior: existe uma sementinha deste ser humano odioso bem ao lado de cada um (a) de nós. Está em qualquer “mas” que tente justificar este massacre (e outros). Aparece todas as vezes em que se relativiza o relato de um estupro, dizendo que a vítima estava vestida “de tal forma”, ou que “estava bebendo”, ou que “não devia estar em tal lugar”. Sua raiz – que pode ou não vingar – está também nas piadinhas sobre mulher “pra comer” e “pra casar”; em cada vez que se estimula um menino a “ser pegador”; e até naquele amigo de esquerda “superdesconstruído”, mas que “não admite” que uma mulher seja melhor do que ele, mesmo na área de expertise dela. Sempre que alguém, ainda diante de todos estes terrores que citei, chama as mulheres de vitimistas, avança-se uma casa em direção àquele homem que, repito: nada tem de monstro.
Neste mundo em que, para muito humano, ser mulher vale menos que ser vidro de banco, não nos resta alternativa.
Que se aprocheguem Frankenstein, Freddie Krueger, Minotauro, Gargamel (meu favorito), Demogorgon e todas as criaturas malignas já criadas por nossas mitologias, lendas e ficções. Faço coro com a galera da maromba: “Vem, monstro!”