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Desobediência

julia coluna
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É claro que tem dias que a gente acorda pau da vida, fulo dentro das calças ou, em bom “jovenês”, “pistola”. Estourada que sou, não é raro que eu tenha alguns deles. E, falando bem francamente, gentileza é muito bom, mas nessas horas dá vontade mesmo é de bater uma porta, gritar uma sequência de palavrões, quebrar um vidro. Civilizados que somos – pelo menos a maioria, acredito -, respiramos fundo, e tendemos a entubar a raiva, passar por cima, esquecer, deixar para lá. Há quem realmente consiga se desligar, desapegar, fazer com que a energia ruim flua, mas infelizmente eu integro o time daqueles que engole a seco e se remói por dentro. Só afeta a nós próprios. Haja terapia. Ainda bem que são apenas dias, e a única certeza que temos é que eles vêm e vão, irremediavelmente.

Se o passar dos anos serve para alguma coisa, é para a gente conhecer melhor quem mais convive conosco: nós mesmos. Na minha caminhada comigo mesma, cada vez percebo o quanto é libertador cometer leves transgressões, tão secretas que às vezes só são subversivas para mim, mas que prazer infantilmente delicioso! Comer a sobremesa antes do almoço. Permitir que eu traia minha obsessão com pontualidade e chegue dez minutos atrasada. Convencer uma amiga a matar aula, uma vezinha só: “ai, vamos beber?”. Criar teorias da conspiração insanas com meus amigos, e fazer com que elas virem piadas das quais só a gente ri. Mas como a gente ri!

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Mandar um áudio de cinco minutos e meio cantando Fafá de Belém, Bethânia ou Nana Caymmi pros meus amigos viadíssimos, daqueles que pegaram o termo e se apropriaram, transformando o xingamento em poder. Romper com todo mundo que faz mal. Viver perigosamente e tomar um copão de Coca-cola de manhã, mesmo sabendo que é um veneno. Ficar dez minutos a mais na cama afagando os pêlos da minha gatinha filhote e pensando: ‘mas gente, como essa bichana cresceu!”. Dizer não. Dizer sim, também. Falar bobagens e gargalhar até as lágrimas escorrerem. E a maior desobediência civil em tempos tão duramente pesados: amar, sem medidas. A mim e aos meus. Dulcíssima transgressão.

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