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Nas nuvens

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Quem me vê nas redes sociais cheia de carão e batonzão – e nessa época do ano, glitter e peruca – custa a acreditar, mas eu sempre fui muito insegura. Ao longo de toda minha vida, só a possibilidade de qualquer opinião alheia sobre mim, positiva ou negativa, me afetou profundamente. Como era de se esperar e como bem já expus nesta coluna, minha saúde mental não saiu ilesa disso, e até o dia de hoje, sempre que estou sob pressão, ou que muita coisa está acontecendo na minha vida (para bem ou mal), estou sujeita a ataques de pânico e ansiedade, com os quais hoje lido bem depois de ter sido diagnosticada e tratada.

Dito tudo isto, é estranho pensar por que alguém como eu resolve se expor tanto numa verborragia semanal e pública, assim como faço agora. Em primeiro lugar, é porque o tempo passa e a gente percebe duas coisas: uma é que as pessoas, na realidade, não estão dando a menor pelota para nós, portanto sequer estão pensando em ter uma opinião a respeito. A outra é que, caso tenham de fato algum julgamento sobre o que somos, este pertence só a elas. Então, a menos que quem te ache incompetente seja seu chefe, quem te veja fria seja seu amor e quem te chame de mala sejam seus amigos, o que os outros pensam não tem qualquer valia. Um dia a gente cresce e percebe isso – embora não sem dor.

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Mas tem um outro motivo, muito maior, para que eu não me cale. Todas as vezes em que uso, muito humildemente, este espaço público de opinião para apontar e criticar desigualdades, preconceitos, injustiças e desrespeitos – ainda que escrevendo do topo de uma montanha de privilégios -, não falo só por mim – muitas vezes, nem posso me incluir no pacote. Mas sempre que meu discurso ameaça alguma posição de poder e opressão sobre outras pessoas, uma metralhadora de ódio vira-se contra mim, pessoalmente, como mulher, profissional e humana. E tudo bem – mesmo, juro!

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Porque é exatamente quando sei que toquei em uma ferida que ainda precisa ser muito cutucada, um assunto que precisa realmente ser discutido à exaustão. “É minha opinião”, “É o que eu acho”, “Penso assim”: se este argumento tira o direito de alguém, não é liberdade de expressão, é opressão. E, enquanto eu tiver mãos para escrever combatendo este tipo de pensamento, é exatamente isso que farei.

Na semana passada, ao criticar veementemente a forma como a sociedade legitima a alienação dos pais da criação de seus filhos e vê este ofício como dever absoluto da mãe, quase não tive críticas sobre meus argumentos. Mas recebi, em troca, alcunhas como “otária”, “esquerdista recalcada fazendo intriga”, “chifruda”, “chata”, “doente mental”, “feminazi”. É como se eu ameaçasse tomar o doce de uma criança mimada e ela retrucasse: “boba e feia”, aos prantos. Por isso mesmo, se o que escrevo ameaça de alguma forma tomar o docinho privilegiado de homem, hétero, cis, branco e de classe média (obviamente estou falando de condições estruturais de favorecimento) e faz de mim uma “chifruda” – só para usar o adjetivo mais divertido -, eu peço que avisem às nuvens. Porque é lá que eu espero que meus galhos cheguem, pois tenho planos de ser muito, muito mais chifruda. Não importa o quanto as crianças mimadas chorem.

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